segunda-feira, 3 de agosto de 2009

Luzes da Ribalta

"Se uma coisa pode existir na opinião, sem existir na realidade, e existir na realidade, sem existir na opinião, a conclusão é que das duas existências paralelas a única necessária é a da opinião, não a da realidade, que é apenas conveniente." ("O Segredo do Bonzo" - Machado de Assis)

Em tempo de obscurantismo para o jornalismo em que as incerteza sobre seu habitus parecem redefinir as regras do jogo, a percepção do que é e daquilo que será o jornalismo está posta em xeque.

A não obrigatoriedade do diploma e o desmembramento do jornalismo das comunicações sociais rumam, longe da crítica ordinária, ao encontro que define o jornalismo e sua especificidade. Pois sim, sou favorável a estas duas medidas. Por alimentar alguma descrença na forma como os cursos de jornalismo são estruturados, por não entender a ortodoxia apregoada por nossos educadores e "empresas da informação", por acreditar que um outro jornalismo é possível e por ser benjaminiano mas jamais um frankfurtiano, é que se justificam minhas opções.

Meio a conversas intesas e sempre agradáveis com meus amigos, agora já jornalistas diplomados e registrados, na tentativa, quase existencialista, de entender quem somos e qual nossa função, certas conclusões interessantes e equivocadas acabam por surgir (já que todo equívoco é estágio para o acerto). Lembro-me de uma que à época achei certa graça, confesso, embora não tenha se sustentado por muito tempo, afirmava o jornalismo como gênero linguístico e, portanto, dotado de implicações, porém meramente textuais. Explico. Diante desta perspectiva o jornalismo é reduzido ao plano do discurso verbalizado, à uma competência textual ou à um saber técnico, isto é, aprendendo as implicações linguísticas deste gênero aprenderia-se jornalismo. Esta lógica não é de toda absurda, mas não dá conta de toda complexidade.

Ainda durante estas sessões de filosofia de mesa de bar, eu mesmo chegeui a categorizar de que o jornalismo não é ciência, opinião de que ainda compartilho, mas já de forma cautalosa.
"Cada manhã somos informados do que acontece em todo o mundo. E, no entanto, somos pobres em histórias maravilhosas" é o que diz Walter Benjamin em "O Narrador" e ele vai além, "Isso ocorre porque não chega até nós nenhum fato que já não esteja impregnado de explicações.". Foi com este texto de Benjamin em mente que neguei o caráter científico do jornalismo.

A informação, matéria prima para o jornalismo, tal qual é transmitida nesta indústria cultural em nada contribui para a aquisição de um saber ou conhecimento que não esbarre na banalidade. A verificação imediata dos fatos não permite a troca de experiência, tudo está em prol da explicação inteligível por si mesma. O leitor carece da liberdade de interpretar as coisas como as entende, sua memória fica em supressão. Não há construção do novo, "frequentemente ela (a informação) não é mais exata do que fora a notícia de séculos precedentes", W. Benjamin. Para o poeta (marginal?) Chacal:

"as prensas não podem parar
notícia notícia notícia
revista já vista já velha
reprocessando matéria
clonando idéia
novelha novelha novelha" ("Cidade").

Assim, a mensagem jornalística dificulta o contraste entre o novo e o velho que objetiva a reconstrução e resignificação dos saberes.

Parece-me excesso de modéstia do jornalismo ao se contentar em apenas relatar o mundo sem dele participar para além de sua força mediadora das tensões sociais.

Talvez, longe da famigerada comunicação social que coloca num mesmo balaio cursos com poucas afinidades (afinal, o que não é comunicação social? uma vez que este é um instrumento inerente ao homem e portanto a sociedade), o jornalismo encontre o caminho das luzes.